O Ciclo do Negócio Imobiliário

Aproveitando o espírito de retomada de confiança na nossa economia, explicito neste texto breve descrição sobre atividade que certamente vive atualmente um ponto de virada. O melhor entendimento do negócio amplia oportunidades para investidores que buscam rentabilidade diferenciada, pessoas que pretendem adquirir imóveis para uso e, sobretudo, para os que pretendem empreender no ramo.

Como já comentado anteriormente, o negócio no ramo imobiliário surge das demandas da sociedade. Estas necessidades podem ser de moradia, de local para se trabalhar, de exploração comercial de uma região, dentre outras diversas situações. Um ciclo de incorporação imobiliária pode ser dividido em 6 etapas:

1. Novos Negócios

O principal insumo de qualquer incorporação é o terreno. Em geral, os corretores de imóveis trabalham a comercialização do terreno, buscando interessados no mercado local. Sua localização, vocação e potencial construtivo são os primeiros elementos a serem analisados por estes interessados – em especial, os incorporadores. Em geral aí se define se é possível a construção de residências para moradia, edifícios para escritórios ou outro tipo de utilização.

Identificados estes elementos, caso haja interesse, o incorporador parte para análises adicionais. É feito o Estudo de Massa, o qual se origina de análise da legislação urbanística. Em função dos limites legais, é na estruturação do Quadro de Áreas que se definem a quantidade e tamanho das unidades imobiliárias a serem comercializadas.

Com estes dados já é possível entender se há possíveis interessados na aquisição destas unidades imobiliárias. É feito nesta oportunidade a Pesquisa de Mercado, buscando-se entender preliminarmente – de forma quantitativa e qualitativa – a percepção do mercado sobre produto, preço, localização, público alvo, dentre outros. Em paralelo, são montados os cenários do Estudo de Viabilidade. Neste são analisados indicadores como lucratividade e exposição financeira do projeto. É testada a sensibilidade destes indicadores à variação de preço e curvas de vendas, assim como avaliada demanda por contratação de financiamento bancário para a construção.

Estes dados, em conjunto com avaliações de risco e retorno econômico, proporcionam uma leitura preliminar se é possível o desenvolvimento de um empreendimento imobiliário na área avaliada e quanto é possível pagar por este terreno. A negociação em geral se dá através de uma Opção de Compra – com prazo, preço e forma de pagamento. O incorporador tem no prazo da Opção o dever de avaliar qualquer problema legal relacionado ao terreno, assim como validar internamente na empresa a compra do mesmo. A partir daí, dá-se a lavratura da escritura de compra e venda do terreno, documento formal que registra as bases acordadas do negócio, nesta incluída a sua forma de pagamento – em dinheiro ou em unidades autônomas (permuta).

 2. Incorporação e Projetos

Esta etapa, já com o terreno adquirido, aprofunda as análises feitas previamente e desenvolve pontos adicionais. O produto é melhorado, buscando-se dar mais eficiência entre a área que será comercializada e a área que será construída. A arquitetura é definida através de informações tais como o tamanho dos cômodos, padrão de acabamento, elementos de fachada, equipamentos da área comum e vagas de estacionamento. São contratados os escritórios de arquitetura para elaboração do Projeto Legal – que será aprovado pela municipalidade – e do Projeto Executivo de Arquitetura.

Este é o momento em que se evolui com as questões societárias (abertura de SPE´s, estatutos, acordos de acionistas) e legais (alvarás de obra e demolição, aprovações em concessionárias, definição de responsáveis técnicos, cadastro em órgãos, dentre outros). Um marco fundamental desta etapa é o Registro do Memorial de Incorporação no cartório de imóveis. Este documento faz o vínculo entre o terreno existente naquele momento, com o futuro empreendimento que surgirá incorporado ao mesmo. Atesta a idoneidade de toda a operação, assim como discrimina o fracionamento – fração ideal – do terreno em virtude dos novos imóveis a serem incorporados. Dá publicidade à minuta do Contrato de Promessa de Compra e Venda e à Convenção de Condomínio, ratifica se a incorporação tem o patrimônio afetado, além de informar sobre o prazo de carência o qual o incorporador pode desistir do negócio antes de iniciar a construção.

Atendidas as questões de produto e legais, esta etapa avança com o desenvolvimento do conceito da marca do empreendimento e com a criação da sua campanha publicitária. É feito todo o planejamento dos investimentos e ações de publicidade, assim como a construção do Stand de Vendas o qual, em geral, inclui uma amostra do imóvel a ser comercializado denominada “Decorado”.

O ideal que esta etapa se conclua com os projetos executivos de arquitetura e das demais disciplinas concluídos e compatibilizados. Isto é base do levantamento de quantitativo e, por consequência, base para a elaboração do orçamento da obra. A correta contratação da empreitada é fator crítico de sucesso para o negócio de incorporação.

 3. Lançamento e Vendas

Este é o momento de pôr em prática a campanha publicitária, veiculando na mídia as peças, assim como distribuindo o material de vendas aos corretores. Para estes são feitos eventos específicos – Convenções de Corretores – que visam apresentar o produto, diferenciais competitivos e posicionamento de mercado à força de vendas.

É comum ser feito um evento para lançamento do empreendimento, com a abertura do Stand de Vendas e do Decorado para os interessados. Partindo da premissa que as vendas em sua maior parte são feitas de forma parcelada – em média apenas 30% do imóvel é pago até a conclusão da obra – todos os interessados devem ter o seu crédito analisado previamente. Isso atestará a sua capacidade de pagar as parcelas previstas para o período da construção, assim como a sua capacidade quitar com recursos próprios ou contratar um financiamento bancário para pagamento do saldo contratual pós-obra.

As vendas são formalizadas através de um contrato denominado Promessa de Compra e Venda em caráter irretratável e irrevogável e podem ser registradas no cartório de imóveis da região. Atualmente é ponto de discussão a possibilidade de rompimento (distrato) destes contratos em caso de adimplência das partes, o que gera forte insegurança jurídica e afeta toda a cadeia do setor.

 4. Execução de Obra

A obra pode ser executada diretamente pela própria incorporadora, ou contratada através de uma construtora. Se contratada, é possível utilizar-se a modalidade de Preço Fixo (Global), Administração (Custo Re-Embolsáveis) ou Preço Unitário. A modalidade utilizada irá variar conforme grau de definição do escopo do projeto e nível de risco aceito pelas partes.

Senso comum que a construção é um grande projeto, que está inserido em um projeto ainda maior. Deve para isso ser gerenciado detalhadamente em escopo, tempo, custo e qualidade, dentre outros, de forma a garantir o sucesso da incorporação imobiliária.

 5. Entrega da Obra ao Cliente

Esta etapa é de fundamental importância, vide retoma a relação direta com o cliente, buscando o máximo de satisfação com o produto entregue.

Inicia-se com a vistorias da unidade imobiliária, momento no qual o cliente confere a qualidade e adequação do que está sendo entregue. Caso se identifique irregularidades, as mesmas são anotadas e os reparos feitos.

Em paralelo, é tramitado junto à municipalidade o Habite-se do empreendimento. Este documento atesta que o projeto foi construído conforme projeto aprovado previamente pela prefeitura, tendo portanto condições de uso. O Habite-se deve ser registrado no cartório de imóveis, que nesta oportunidade atestará que o terreno antes existente agora comporta uma edificação com diversas unidades autônomas.

Com o Habite-se emitido há base para um outro processo de fundamental importância – a realização da Assembleia de Instalação de Condomínio. Nesta oportunidade, o incorporador reúne todos os adquirentes do empreendimento, elegendo síndico, sub-síndicos e conselhos. É possível também neste momento dar definição sobre a administradora que dará apoio aos serviços de portaria, vigilância e limpeza, aprovar valor das cotas condominiais ou outros procedimentos de utilização das áreas de uso comum. Entendido como um serviço que agrega valor na relação com o cliente, em geral é realizado em seguida um outro evento de caráter festivo, dentro do empreendimento.

A área financeira em geral atesta a quitação da unidade ou direciona o cliente para um banco que possa financiar o saldo restante a pagar. Com o imóvel aceito em vistoria, Habite-se emitido, condomínio instalado e pendências financeiras resolvidas é realizada a entrega das chaves da unidade, dando assim a posse da unidade ao adquirente.

 6. Pós-Obra

Esta etapa se relaciona à garantia do produto entregue. Pela lei brasileira, é requerido ao incorporador garantir o imóvel vendido contra defeitos ou vícios ocultos pelo prazo de 5 anos. Em geral o cliente e síndico recebem manuais para manutenções de rotina do imóvel e da área comum do empreendimento. É comum a incorporadora ter uma equipe permanente para atendimento e solução dos chamados que se relacionem à garantia.

Uma Breve História da Incorporação Imobiliária

O direito à propriedade tem sua concepção mais estruturada no direito da Roma Antiga. Propriedade-família-religião foi o tripé no qual se desenvolveu esta civilização e que formou as bases para o desenvolvimento no Ocidente do conceito de propriedade: usar, gozar e dispor de um item ou espaço, de modo absoluto, exclusivo e perene. No mundo capitalista, o direito à propriedade é pilar fundamental para o desenvolvimento de uma sociedade próspera. A propriedade privada garante o uso do espaço de forma produtiva, atribuindo-lhe valor comercial, tornando-o uma importante fonte de capitalização da economia.

O avançar da Revolução Industrial no século XIX inaugura novo período de prosperidade, em especial na América, como nova fronteira de oportunidades. A propriedade privada foi fundamental para que muito deste desenvolvimento surgisse. Ela é início, meio e fim da atividade imobiliária.

O ‘incorporador” desta época era um homem de outros negócios, o qual usava a construção de edificações como uma atividade meio para a sua atividade na indústria ou comércio. Foram diversos os fatores para o desenvolvimento da atividade profissional no ramo imobiliário. Podemos citar: a ocupação territorial como forma de controlar regiões, a maior produtividade da agricultura, o que propiciou as famílias irem para a cidade e a explosão populacional alavancada pela imigração e o crescimento econômico.

O desenvolvimento dos meios transportes foi também um diferencial para ampliar as oportunidades do segmento. Inicialmente com valorização restrita às proximidades do modal marítimo e fluvial, as localidades e terrenos próximos às ferrovias tiveram destaque ao longo deste século. Era comum a parceria entre os investidores de grandes obras ferroviárias com os proprietários das terras por onde estas passariam, sempre focando o benefício mútuo. Em um período ainda anterior ao automóvel, a dinâmica de trabalho e moradia demandava que as residências estivessem próximas às fábricas. Na medida que se tornavam escassos os terrenos nestas proximidades e apoiada por inovações da época – como a estrutura metálica e os elevadores – a verticalização foi um caminho natural.

O início do século XX foi beneficiado por uma safra de “incorporadores” e empreiteiros com certa experiência. O surgimento dos carros, de novos meios de transporte – a inauguração do metrô de Nova York se deu em 1905 – e de novos meios de comunicação, reduziram substancialmente as distâncias. Isso levou novos projetos imobiliários para regiões mais afastadas dos grandes centros, trazendo consigo inovações de forma a atender às novas demandas. Um desses exemplos foi a inauguração do primeiro “shopping center”, no ano de 1951, na cidade de Detroit. Este período foi marcado também pela construção dos primeiros arranha-céus. Estes visavam, além de construir grandes áreas em terrenos relativamente pequenos, dar notoriedade à empresas e localidades que os empreendiam. O financiamento dos projetos deste período dava-se basicamente através de capital próprio. Com o sucesso dos empreendimentos, paulatinamente os bancos passaram a ver no ramo uma fonte vigorosa de oportunidades, passando assim a abrir linhas de crédito para esta área e dinamizando de forma exponencial a atividade.

É notória a evolução e sofisticação do escopo de trabalho do incorporador ao longo dos últimos dois séculos. Porém a análise mais profunda encontra a mesma essência para os profissionais que se dedicam a esta atividade: identificar necessidades na sociedade com o intuito de desenvolver soluções para atende-las, tendo como ferramenta para isto a formação de parcerias com governos e empresas.